Como é de conhecimento, o mês de setembro é dedicado à conscientização sobre a prevenção do suicídio. O tema nos convida a refletir sobre a importância da saúde mental e vem ganhando espaço no ambiente de trabalho, tornando-se uma responsabilidade também no âmbito trabalhista das empresas.
Com a NR-01, o tema passou ocupar um papel central nas discussões sobre qualidade de vida, produtividade e responsabilidade social corporativa.
Ao mesmo tempo, os riscos trabalhistas e judiciais decorrentes da omissão quanto ao tema tornaram-se mais evidentes, pressionando empresas a adotarem medidas concretas de prevenção.
Nesse cenário, os programas de compliance trabalhista voltados à saúde mental surgem como uma estratégia eficaz para promover ambientes mais saudáveis, reduzir os passivos judiciais e fortalecer a cultura organizacional.
O compliance trabalhista trata-se de um programa de conformidade e gestão corporativa com o foco na adequação das empresas à legislação trabalhista, ou seja, um conjunto de práticas e políticas adotadas por uma companhia para garantir o cumprimento da legislação trabalhista.
No entanto, o Compliance não só visa mitigar risco, mas também promover um ambiente saudável, ético e respeitoso.
Assim, o Compliance aliado a saúde mental é um novo Pilar do Compliance que vem ganhando força, especialmente diante do aumento de afastamentos em razão doenças como burnout, depressão e ansiedade entre os trabalhadores.
Segundo dados do Ministério da Previdência Social sobre afastamentos do trabalho, em 2024, foram quase meio milhão de afastamentos, um aumento de 68% comparado ao ano anterior. (https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/noticia/2025/03/10/crise-de-saude-mental-brasil-tem-maior-numero-de-afastamentos-por-ansiedade-e-depressao-em-10-anos.ghtml)
Assim, diante desse novo cenário, e do crescimento exponencial dos afastamentos, a saúde mental dos colaboradores deixou de ser uma questão apenas médica ou pessoal, mas criou-se a necessidade de envolver as empresas no assunto. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) destacam que ambientes tóxicos, excesso de trabalho, assédio moral e ausência de suporte emocional são fatores que contribuem diretamente para o adoecimento psíquico.
Inclusive, a Conferência Internacional do Trabalho (CIT) de 2022 reconheceu que o direito ao ambiente de trabalho seguro e saudável deve integrar os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da OIT. (https://brasil.un.org/pt-br/292926-brasil-afastamentos-por-problemas-de-sa%C3%BAde-mental-aumentam-134)
Nesse contexto, o compliance passa a atuar como ferramenta preventiva e educativa, com foco de Identificação de riscos psicossociais; Implementação de políticas internas de saúde mental; Treinamento de lideranças; instauração de Canais de denúncia eficazes; além do monitoramento e auditoria contínua das práticas organizacionais.
Frisa-se que a inclusão da saúde mental no Compliance Trabalhista não é apenas uma necessidade, mas também um benefício às empresas, visto que diminui os passivos trabalhista, através da prevenção, reduzindo processos relacionados a assédio moral, danos morais ou indenizações por afastamentos relacionados a doenças mentais; mitiga riscos de ações judiciais coletivas, bem como elaboração de termos de ajustamento de conduta (TACs) e fiscalizações do MPT (Ministério Público do Trabalho); valoriza a imagem institucional, demonstrando o interesse das empresas a responsabilidade social, além do aumento da produtividade. Frisa-se que ambientes saudáveis favorecem o engajamento, a motivação e a retenção de talentos.
Conforme muito bem-disposto pelo diretor do Escritório da OIT para o Brasil, Vinícius Pinheiro:
“É preciso internalizar que o investimento em saúde é um ganha-ganha para as pessoas, para as famílias, para as empresas e a sociedade como um todo. O investimento na promoção da saúde mental beneficia toda a sociedade,
porque promove ambientes de trabalho seguros e saudáveis, minimiza a tensão e os conflitos e melhora a fidelização do quadro de pessoal e o rendimento e a produtividade do trabalho.”
Mas como é possível colocar em prática um Programa de Compliance com Foco em Saúde Mental?
Inicialmente, deve-se realizar um diagnóstico organizacional, ou seja, analisar e avaliar a empresas e suas áreas. A partir daí, ter políticas claras e de conhecimento de todos da empresa, com a criação de códigos de conduta, políticas antiassédio e manuais internos que contemplem o cuidado com a saúde emocional dos colaboradores. Além disso, se faz necessário investir em treinamentos contínuos das lideranças.
Importante ainda, que as empresas possuem programas de apoio psicológico e campanhas de conscientização sobre saúde mental. Os canais de denúncia, em que pese não ser algo novo, vem como um aliado para esse sistema, pois trata-se de um mecanismo acessível e confidencial, para que os trabalhadores possam reportar assédios e outras práticas prejudiciais. Por fim, a é necessário que a empresa realize o monitoramento contínuo dessas práticas, com a revisão periódica das práticas adotadas, com indicadores e métricas de saúde organizacional.
Os programas de compliance trabalhista voltados à saúde mental são mais do que uma tendência: são uma necessidade estratégica, ética e legal. Ao adotar uma abordagem preventiva, as organizações não apenas reduzem seus riscos jurídicos, mas também constroem ambientes sustentáveis e produtivos.
Investir em saúde mental no trabalho é, portanto, um compromisso e uma responsabilidade que deve ser levada a sério por empresas de todos os portes e setores.
Raquel Duarte da Conceição Miranda Walker – Advogada graduada pela PUC-Campinas (2008), com pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho pela PUC-SP (2013) e especialização em Gestão de Pessoas e Compliance Trabalhista pela FGVLAW (2019). Atuação predominante na área Trabalhista. OAB/SP 287.906.